Afinal o que queremos nas organizações? Não queremos líderes e colaboradores responsáveis, mas sim verdadeiros “franchisados” da organização que mantenham a motivação (dedicação voluntária persistente) sempre em níveis máximos, durante um longo período de tempo (o que não é fácil). E muito menos possível de “comprar” com altos salários ou “fringe benefits” fantásticos.
Construir núcleos organizacionais comprometidos, motivados, justos, eco responsáveis, socialmente integrados, educados, focados em objectivos comuns, respeitando a herança cultural, mas desenvolvendo padrões mais elevados. E em suma que atingem resultados (baseados nos KPIs fundamentais para as organizações.)
Mas se sabemos o que queremos, também sabemos que a forma de atingir este objectivo num mundo em mudança, não será fácil. Como iremos atingir e como vai ser o futuro a partir de agora?
Será uma conquista, diária e ganha de forma genuína baseada num acrónimo – T.A.R.A. Ou seja, estimulando a confiança dos colaboradores e exigindo lealdade (“Trustability”). Sendo responsável de forma intensa e esperar responsabilidade dos outros que o rodeiam (nunca ouvindo desculpas, apenas problemas e propostas de soluções). Ou seja, “Accountability”. E finalmente sendo respeitável (“Respect”), respeitando as boas práticas de ESG (“environment & social & governance”) e exigindo o mesmo dos outros respeitando as suas competências e conhecimento (“Respect ability”).
Por outro lado, queremos colaboradores que valorizem a auto (e não apenas a hétero) motivação, pois não vale a pena tentar motivar colaboradores que não querem ser motivados.
No futuro, os trabalhadores terão várias carreiras, aprendendo ao longo da vida com competências fluídas (Liquid Skills), cruciais para reforçar a sua empregabilidade. Colaboradores que potenciem e integrem as novas tecnologias (IA, robótica, machine learning). Até porque a OCDE estima que apenas 10% dos trabalhadores serão substituídos pelas máquinas (pois apenas 25% estão em funções 30% automatizáveis), o que significa que tem de existir um “diálogo” com a tecnologia baseado numa literacia digital que tem de ser desenvolvida pelas organizações.
Outro ponto fundamental que iremos ver nas organizações, e que se relaciona com o princípio T.A.R.A., tem a ver com o aumento da humanização do trabalho, o aumento da motivação para o mesmo, pela existência de um propósito (dever do empregador), e do enfoque no bem-estar organizacional. O salário já está a perder a força no processo de retenção de talentos e a tendência é que essa prática se fortaleça. Não se trata de um fator higiénico, mas não é o único fator a ser fundamental para a manutenção do talento.
O compromisso das equipas será por uma causa, e não por um valor. Todos deverão acreditar na missão da empresa e envolver-se nela. Acrescido pelo facto de as funções serem cada vez mais complexas e menos mecânicas (tais como resolução de problemas com as novas tecnologias), pelo que se necessita de uma forte literacia tecnológica.
Outro ponto relevante tem a ver com as estruturas hierárquicas e o modelo de decisão organizacional: as hierarquias vão ser alternadas pela gestão de projectos utilizando as melhores competências disponíveis. Sendo fundamental a autonomia, competências de coordenação e colaboração que vão complementar as competências específicas do projecto.
Irão ser delegadas tarefas, mas também responsabilidade. Se temos uma geração preparada para a evolução tecnológica, então deve ser esta a liderar os projetos relacionados com este tema. Este modelo de gestão e decisão irá tornar as carreiras em formato “Z” e não verticais ou horizontais como no passado. Para isso vai ser fundamental que cada colaborador se torne um Coach, que vai surgir dentro da empresa, de forma a evitar os choques geracionais e potenciar as melhores competências para cada projecto específico.
A Remuneração vai mudar, portanto, vai ser cada vez mais variável e menos fixa, potenciando a “accountability” individual e participação dos colaboradores nos resultados da empresa. O que significa que os rendimentos vão aumentar, mas não em todos os colaboradores, apenas para aqueles mais produtivos e, portanto, o fosso salarial vai ser aumentado.
O Auto-emprego e auto-gestão vai aumentar (pelo que temos de pensar em novos modelos de reforma), sendo que os vínculos laborais serão flexíveis e aparecerão novas formas de contrato plural.
Formas como o “Free lancer”, trabalho temporário, entre outros; que permitirá uma maior flexibilidade e amplitude de carreiras e desafios. Algo que não se coaduna com a legislação laboral Portuguesa, rígida, pouco flexível, desadaptada do modelo económico, que leva os empregadores muitas vezes a preferir não recrutar novos trabalhadores.
Portanto será o fim dos sindicatos como os conhecemos, nomeadamente aqueles que apenas defendem uma das partes da equação (a dos trabalhadores). Terão de se adaptar e defender os trabalhadores, mas também as organizações e sua produtividade, pois apenas se podem distribuir resultados se estes existirem. Portanto apenas sobreviverão os sindicatos que participam na gestão e otimização dos resultados (como alguns sindicatos alemães), com a divisão dos resultados entre acionistas e trabalhadores.
Veremos situações de “Blocalização laboral” e “Trustability” em empresas e blocos ESG e com práticas objectivamente avaliadas, pelo que a emigração não será feita para países com os quais culturalmente não nos identificamos ou que não defendam os direitos humanos. Não podemos emigrar para países que promovam o trabalho infantil ou não promovam a igualdade de género, por exemplo.
Outra variável que irá mudar é a visão sobre o desenvolvimento de competências. Os empregadores precisam de suportar a educação e o desenvolvimento do conhecimento, pois o valor da educação formal já não reside na aquisição de conhecimentos, mas no desenvolvimento de uma capacidade de aprendizagem (ou seja, desenvolver a “capacidade de aprender todos os dias” face às evoluções diárias a que assistimos).
As empresas têm de continuar a olhar para os colaboradores internos como “clientes internos” e desenvolver a “Employer journey” dentro da organização, assim como fazemos com os nossos clientes externos. Assim conseguiremos ver pontos fracos e fortes da manutenção do talento e otimização da eficiência. Pelo que os departamentos de recursos humanos terão cada vez mais um papel relevante nas organizações.
Até porque o bem-estar (não gosto de índice da felicidade pois é uma variável mais pessoal que organizacional) será uma medida de sucesso (como o valor da marca o é), pois permite aumentar a eficiência, inovação, “accountability” e os resultados. Mas infelizmente a “liquidez” do emprego vai aumentar o turnover devido á menor lealdade organizacional que vemos. Já não há empregos para a vida toda!
Finalmente, defendo o Individualismo corporativo e não modelos novos híbridos de trabalho. Trabalho remoto de forma transversal julgo que é uma “moda” inútil e que apenas gera baixa produtividade. O individualismo corporativo permite adaptar a cada colaborador a solução para a sua necessidade, seja trabalham em modo remoto em determinada percentagem do seu tempo, modelo de trabalho em part-time, modelo de trabalho presencial (até porque há colaboradores que não querem trabalhar remotamente). Relembremos que as funções com elevado potencial para trabalho remoto representam apenas 30% da população empregada em Portugal (fonte: Deloitte).
O modelo deve ser personalizado, maximizar a eficiência, a moral, eliminando o burnout, e aumentando a moral de grupo e sensação e segurança dos colaboradores. Portanto defendo o individualismo corporativo que seja Hiperlocal e não Híbrido e Remoto.
Em suma, será certamente um “admirável mundo novo” em que importa lembrar uma célebre frase sobre quem queremos ter ao nosso lado: “E quem estará ao meu lado nas trincheiras? E isso interessa-te? Mais do que apropria guerra!”
Fonte: https://lidermagazine.sapo.pt/e-agora-como-vai-ser-o-futuro-do-trabalho/